terça-feira, 16 de dezembro de 2014

AMIGO OCULTO




                                  

Humanos e desumanos:

Nestas datas natalinas e de fim de ano é comum o encontro de criaturas para comemorações. É feito um sorteio com o nome das pessoas, mantido em sigilo. No dia, cada um declara o seu amigo oculto e o que pensa sobre o outro, as características, etc. entregando seu presente. A festa é regada de boas iguarias. Bebidas finas. Naquele 12 de dezembro as pessoas preparavam o evento. Decoraram as mesas com acepipes dos mais saborosos, tortas salgadas e doces, bolos, etc. Além dos tradicionais refrigerantes e sucos. Vinhos da melhor qualidade.Enchiam-se bolas coloridas.
Vesti-me com roupas de verão, pois este estava insuportável. Com elegância, alguma maquiagem e minhas italianas sandálias douradas. Meu motorista particular, o moreno indiano Neca di Pitibiriba (Piti para os íntimos), abriu a porta do veículo com suas luvas brancas. Saltei de minha limusine refrigerada azul profundo. Claro que algumas partes generosas do corpo refrescavam-se ao vento tímido. Entrei no salão de festas e fui alvo de olhares masculinos (como são tolos!). Cumprimentei a todos e todas. Deixei na bela mesa exposta caviar da Rússia com baquetes francesas. Não faltava mais ninguém.
Após degustarmos aquelas iguarias e bebermos do melhor, chegou a hora dos presentes. Reparei que as pessoas exageraram na bebida. Sentamos numa roda de cadeiras e por acaso, seria à última que declararia meus sentimentos e entregaria meu presente ao meu amigo oculto.
O primeiro levantou-se e cambaleante com a voz embargada disse: ­­"-O meu amigo oculto é aquele vagabundo ali, que me pediu um dinheiro emprestado há 03 anos e ainda não me pagou! Freqüenta a minha casa, paquerando a minha mulher!...” Rapidamente este se levantou com a dificuldade de um bêbado, gargalhando replicou:-“ Pois a minha amiga oculta ali é aquela fofoqueira que eu sei que tem um caso com uma mulher aqui presente, que eu direi o nome alto e bom som!...” A mencionada, com as mesmas características dos dois, levantou-se e atacou:- “-Sou mesmo e assumo! Mas não sou como aquele indivíduo ali, que infelizmente é meu amigo oculto e é um político corrupto! Um ladrão do nosso povo!...” Este se levantou e com a língua enrolada defendeu-se:-“ Olha como fala comigo!...” E, pateticamente mostrou uma carteira, que supus ser de alguma autoridade e sem equilíbrio do próprio corpo a deixou cair no chão, sendo chutada alegremente por alguns. O político disparou: “-O meu amigo oculto é aquele safadinho ali, que de homem não tem nada: se veste de noiva e freqüenta lugares... como direi... imorais, contrários aos nossos costumes, e da nossa sociedade!...” Este se levantou e tonto esbravejou: ”-Vossa Excelência (irônico) é que é imoral, pois freqüenta uma casa de massagem toda semana e é casado! E, arrematou,rindo, com a típica voz dos bêbados:-“ A minha amiga oculta, aquela jovem, sabe disto porque trabalha na casa de massagem...!”Esta respondeu, rindo:-“ Trabalho sim e com muito orgulho e ninguém tem nada com isto!... Aliás, alguns presentes, casados, a freqüentam assiduamente!Quer saber quem?...”
A confusão e o escândalo instalaram-se naquele recinto. O ciclo de amigos ocultos não se completara. Os que beberam pouco ou nada procuravam aplacar os ânimos. A polícia foi chamada. Saí de fininho e não encontrei mais o meu amigo oculto. A festa tinha terminado.
Na rua pude ouvir a sirene de polícia, bombeiros e ambulâncias chegando ao local. O meu indiano motorista particular abriu a porta de minha limusine azul profundo. Cheguei a minha mansão estilo bávaro normando. Deliciei-me em minha egípcia banheira semi olímpica dourada com sais paquistaneses, preparada por minha fiel governanta Goldawasser. Acendi um autêntico cubano e após deliciosas baforadas, pensei no oculto amigo. O que diria para o mesmo. Pensei tb. em meu tio Leibowyczwy que dizia profeticamente:-“ In Vino Veritas!...”.
f.a.